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O cinema usado como intervenção no contexto de medicalização do social no contemporâneo
Mestrando da Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Estadual Paulista -
Co-autores:
Graduando em Psicologia da Universidade Estadual Paulista – Campus de Assis
Graduanda em Psicologia da Universidade Estadual Paulista – Campus de Assis
Graduanda em Psicologia da Universidade Estadual Paulista – Campus de Assis
Quadro conceitual
Vivemos um processo de expansão das rotulações de diagnósticos
psiquiátricos que hoje atinge pessoas das mais diversas idades. Na atualidade todos
nós estamos submetidos às estratégias de patologização das mais diversas
questões existenciais. Nesse contexto, problemáticas interdisciplinares passaram a
ser capturadas por discursos e práticas do saber-poder médico-psiquiátrico e
transformadas em psicopatologias, cujo tratamento não escapará do principal
instrumento da psiquiatria na contemporaneidade: os psicofármacos.
Percebe-se que a medicalização é um fenômeno atual que submete cada vez
mais sujeitos ao julgo médico-psiquiátrico, que considera qualquer referência aos
conflitos e sofrimentos psíquicos como algo exclusivamente de ordem biológica
(INIART E RÍOS, 2012; BRZOZOWSKI E CAPONI, 2012).
Essa dinâmica, nos dias de hoje, é consequência da banalização de
diagnósticos psiquiátricos e da generalização da prescrição de psicofármacos, o que
culminaria no fenômeno de individualização de questões da ordem social, política,
econômica, cultural, familiar e educacional referentes à infância. Processo atrelado a
valorização da concepção organicista do sofrimento psíquico que, por meio de
diversas estratégias, promovem o apagamento das diferenças e das singularidades.
O grupo de estudos e pesquisas, ”Medicalização do social no
contemporâneo”, surgiu a partir destas problematizações relacionadas ao tema da
medicalização e psicopatologização da vida. Criado após as discussões realizadas
no evento “Medicação em debate: simpósio sobre a expansão do uso de
psicofármacos” realizado no ano de 2009 na Unesp - campus Assis,São Paulo, e
que contou com a participação de mais de 200 pessoas entre estudantes,
professores e profissionais da saúde e educação. O surgimento do grupo teve como
objetivo dar continuidade ao debate e promover novos encontros e produções.
A partir das discussões suscitadas no simpósio, formou-se um grupo de
estudantes da graduação e pós-graduação em psicologia com o intuito de
aprofundar os estudos e difundir debates acerca da temática da medicalização. Com
a construção de pesquisas por meio de levantamento de dados, a produção de
trabalhos científicos, a promoção de discussões e intervenções que pudessem ser
disparadores de reflexões sobre o problema da medicalização do social e da
banalização da prescrição de psicofármacos na atualidade, o grupo conquistou
também os espaços das instituições de saúde e de educação naquele município
Buscando ampliar e democratizar a discussão acerca dos temas estudados
em grupo e de promover discussões que não atingissem apenas os alunos
vinculados ao curso de psicologia, mas também os estudantes de outras áreas do
campus, professores e, principalmente, profissionais da saúde e educação, além da
população do município, no segundo semestre do ano de 2012 foi realizado o “I
Ciclo de Filmes e Debates sobre o processo de medicalização do social”. Com a
periodicidade de exibição de um filme por mês, foram projetados e discutidos os
seguintes filmes e documentários: “Impulsividade” (2005), “Marketing da loucura”
(2005), “Geração Prozac” (2001), “DSM - A farsa mais mortífera da psiquiatria”
(2011) e “Requiem para um sonho” (2000).
Escolhemos a experiência estética promovida pelo cinema por ela não só
condensar uma série de informações ligadas ao fenômeno da medicalização, como
também pela sua capacidade de interceder junto à afetação, à sensibilização da
temática da sistemática patologização das diferenças no contemporâneo.
A escolha dos filmes e documentários ocorreu durante as reuniões do próprio
grupo de pesquisa, que selecionou obras que pudessem sensibilizar e disparar
discussões sobre as seguintes temáticas: a patologização e medicalização da
infância, a expansão da determinação de diagnósticos psiquiátricos, a banalização
da prescrição de psicofármacos, as relações de interesse entre a indústria
farmacêutica e a medicina, bem como as relações entre as dependências químicas
provocadas tanto por drogas lícitas quanto por drogas ilícitas.
Ao final das exibições dos filmes e documentários, professores de diferentes
áreas de conhecimento promoveram análises e problematizações relacionadas às
temáticas colocadas pelo filme em questão.
A intervenção teve como propósito instigar uma reflexão a partir da
experiência estética do cinema, acerca do processo de naturalização de patologias e
de medicalização de comportamentos, atitudes ou gestos que fugiam da construção
social sobre aquilo que é considerado, pelos discursos médico-psiquiátricos, como
normalidade. Ela contou com a participação de estudantes, professores e
profissionais da área da educação e da saúde, além da população em geral
interessada no tema da medicalização e patologização da vida na
O foco principal do ciclo de filmes foi a problematização de um duplo
movimento do processo de medicalização do social na contemporaneidade:
primeiramente, o investimento da psiquiatria biológica nas neurociências, ao tentar
circunscrever todas as manifestações singulares em disfunções neuroquímicas; e,
consequentemente, o processo de invenção de novos transtornos, novas doenças,
fenômeno de patologização de todo comportamento desviante da norma social, com
Sinteticamente, as temáticas dos filmes versaram sobre: TDAH
(“Impulsividade”); o papel da indústria farmacêutica no processo de patologização
(“Marketing da loucura”); depressão (“Geração Prozac”); o manual auxiliar de
diagnóstico, o DSM (sigla em inglês para o Manual de Diagnóstico e Estatística dos
Transtornos Mentais), (“DSM - A farsa mais mortífera da psiquiatria”); e, por fim, uma
possível aproximação entre o uso de drogas psiquiátricas e as drogas ilícitas
Dado a complexidade da trama discursiva dos saberes implicadas na
temática, Contamos como marco teórico norteador do nosso trabalho os estudos do
[.] a Esquizoanálise não incide em elementos nem em conjuntos, nem em sujeitos, relacionamentos e estruturas. Ela só incide em lineamentos, que atravessam tanto os grupos quanto os indivíduos. Análise do desejo, a Esquizoanálise é imediatamente prática, imediatamente política, quer se trate de um indivíduo, de um grupo ou de uma sociedade. Pois, antes do ser, há a política (DELEUZE & GUATARRI, 1996, p. 77-78).
Objetivo
O presente trabalho objetiva relatar a intervenção do grupo de estudos
“Medicalização do social no contemporâneo” realizada por meio da utilização do
recurso estético do cinema como instrumento disparador de discussões relacionadas
à temática da patologização e medicalização da infância e da adolescência na
Metodologia
O método de intervenção utilizado pelo grupo de estudos foi o cinema como
disparador de discussões e produção de conhecimento, que serviu como estratégia
para viabilizar e proporcionar uma linguagem acessível a todos, com fins de
sintetizar uma série de informações sobre o assunto. Buscamos com essa
intervenção uma forma de aplicar os nossos estudos teóricos em uma interface com
o cinema, de maneira a efetivar uma prática de resistência frente ao paradigma
medicalizante, hegemônico na atualidade.
No campo da psicologia contamos com diferentes propostas de intervenção,
que visam à produção de um desvio para a diferença em uma determinada
realidade. Acreditamos que o cinema seja um potente dispositivo, capaz de disparar
discussões e produzir reflexões, portanto, valioso instrumento para a realização
O cinema, segundo Deleuze, é um tipo de filosofia, é um exercício puro de
pensamento, com a ressalva de que não carece de conceitos, mas de sensações
que produzem subjetividades na medida em que causa um estado de
estranhamento entre o olhar e o desenrolar da estória. O cinema é pensamento
autônomo com linguagens próprias, uma “matéria inteligível” que ocupa “um espaço
de irrupção do diferente, um campo de imanência para o exercício do pensamento e
De acordo com a filosofia de Deleuze, o pensamento tem afinidade com o
caos, ou seja, ele busca um mundo além das significações dadas e prontas. “Pensar
é pensar por conceitos, ou então por funções, ou ainda por sensações, e um desses
pensamentos não é melhor que o outro, ou mais plenamente, mais completamente,
mais sinteticamente pensado” (DELEUZE & GUATARRI, 1992, pp. 253-254). É
através deste contato com o caos que singularizamos diferentes formas de pensar,
que podem ser constituídas a partir do exercício da filosofia, das artes ou do cinema.
Assim, para o filósofo citado, não há uma afinidade natural entre o
pensamento e a verdade. Isto sugere variadas formas de exercício do pensamento,
que não detém verdade, mas problematizações. Desta forma, o cinema se fez
importante no nosso exercício de pesquisa-intervenção para que
problematizássemos as questões de nosso interesse: a excessiva patologização e
Para tanto, tentamos promover um exercício do pensamento, através da arte,
ao público presente. Uma vez que, segundo Deleuze, “o pensamento não nasce
sem algo que o force a pensar, algo que violente o sujeito e o force a pensar. O
pensamento só funciona em relação com uma força que o faça pensar” (BUENO,
Nessa perspectiva, resgatamos o filósofo Gilles Deleuze para nos ajudar a
apreender a estética do cinema. Segundo o autor, “o cinema coloca em movimento a
imagem, similar ao que tenta a filosofia com o pensamento. Diferente de outras
obras de arte, o cinema, por meio do automovimento da imagem, e até de uma
autotemporalização” (Deleuze, 1992, p. 79), permite, assim, uma mudança de olhar,
o que implicaria uma possível alteração na concepção que tínhamos do objeto.
A experiência estética possibilita a reflexão criadora por realizar uma dupla função
de invenção, pois ao mesmo tempo em que proporciona um distanciamento, por se
tratar de um filme, proporciona uma aproximação, já que a obra utiliza diversos
Por esse motivo, entre outros possíveis, tal intervenção tenha ressoado com
mais facilidade em um público que não estava tão atento as questões da
medicalização no contemporâneo. A partir desse ponto de vista, consideramos que o
cinema possibilitou a movimentação, criação e produção de um novo olhar em torno
da questão da medicalização das diferenças na contemporaneidade.
Resultados
Diante das preocupações relacionadas ao processo de patologização da
diferença, a intervenção relatada neste trabalho, realizada por meio da exibição dos
filmes, teve o intuito de levantar discussões e problematizações críticas sobre o
processo de construção social das noções binárias opositoras de
normalidade/anormalidade. Noções produzidas e reproduzidas por práticas e
discursos veiculados por saberes disciplinares, tais como a psiquiatria e a psicologia
(Foucault, 1982) e que repercutiriam na mídia, sem deixar de atingir alvos certos
como pais, professores, instituições educacionais e de saúde (Legnani e Almeida,
Os filmes exibidos são documentários e obras ficcionais, contudo não deixam
de ter uma verossimilhança com a realidade. Os enredos baseados nas histórias de
tantas sujeitos que são submetidos aos discursos de normalização, trazem
possibilidades instigadoras para se refletir sobre os processos de psicopatologização
e dos tipos de tratamentos determinados na contemporaneidade, reduzidos
principalmente à prescrição de medicamentos. Por exemplo, assim como ocorrera
com o personagem do filme “Impulsividade”, que foi (as)sujeitado ao diagnóstico de
TDAH e submetido às prescrições psicofarmacológicas, na vida real a história não é
diferente. Pelo contrário, inúmeros são os casos de crianças e adolescentes que
enfrentam dramas semelhantes todos os dias no mundo inteiro.
O número de diagnósticos de TDAH tem aumentado consideravelmente no
Brasil, ainda que psiquiatras vinculados a associações patrocinadas por laboratórios
farmacêuticos aleguem o subdiagnóstico (Mattos & cols., 2004). Além disso, a
patologização de grandes contingentes da população infantil e juvenil é um problema
enfrentado não apenas no Brasil, onde dados divulgados pelo IDUM (Instituto
Brasileiro de Defesa dos Usuários de medicamentos) revelaram um aumento de
1.616% na venda de metilfenidato no país entre os anos de 2000 e 2008 (IDUM,
2009), mas representa um fenômeno global que tem preocupado alguns intelectuais
e profissionais de diversos países no mundo. Em 2013 foi divulgado boletim da
ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária Brasileira), que aponta um
aumento de 75% no consumo de metilfenidato realizado por crianças e adolescentes
de 6 a 16 anos (ANVISA, 2013), dados que revelam o crescimento significativo do
Os trágicos índices referentes à patologização da infância atualizam dramas
da ficção vivenciados no cotidiano, com consequências mais do que reais para a
vida daqueles sujeitos. Como pudemos observar nas histórias contadas através do
cinema, confirma-se a retirada de responsabilidade política, econômica, social e
delega-se ao dispositivo psiquiátrico o agenciamento desses impasses.
Dessa forma, retira-se dos sujeitos padecentes o saber/poder sobre o seu
mal-estar, prejudicando-os no desenvolvimento dos recursos internos para a
construção de saídas e invenção de sentidos para o seu sofrimento, assim,
conseguindo lidar com situações de sofrimento psíquico, tendo uma participação
ativa na resolução de seus próprios conflitos.
Nesse sentido, podemos dizer que a psiquiatria biológica reduz as
explicações do sofrimento psíquico ao déficit neuronal (Brzozowski e Caponi, 2012),
de modo a desimplicar o impasse subjetivo da criança. É inegável a relação de
dependência orgânica e psicológica que o medicamento prescrito provoca, visto que
desde muito cedo são passadas duas prescrições, além da medicamentosa: a
primeira é que, diante de qualquer mal-estar, existiria uma pílula para solucioná-lo; e
a segunda é a transmissão de uma ilusão, de que seria possível passar por uma
vida sem sofrimentos, uma vida esterilizada. Isso seria o contrário da concepção de
que ter saúde é, justamente, ser capaz de conviver com o sofrimento e buscar a sua
Conclusões
Atualmente, as condutas desviantes da norma social, consideradas
inadequadas e/ou indesejáveis, são transformadas pelo saber psiquiátrico em
psicopatologias, as quais têm atingido a todos nós com rotulações diagnósticas.
A intervenção relatada neste trabalho, realizada por meio da exibição dos
filmes ainda que longe de conseguir abranger toda a temática que envolve os
fenômenos da medicalização, possibilitou a construção de debates direcionados não
apenas à academia, mas também às pessoas da comunidade local, sobretudo
profissionais de instituições de saúde e educação, que puderam participar e
A partir de algumas reflexões suscitadas no debate promovido na sequência
da exibição dos filmes, conclui-se que os processos de patologização e
medicalização da sociedade têm ocorrido com o objetivo de incentivar antigos
mecanismos e estratégias de normalização, relacionadas a uma suposta adaptação
de sujeitos a uma norma estabelecida pelas sociedades disciplinares, conforme nos
convida a refletir os estudos realizados por Michel Foucault (1982).
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mat%C3%A9ria-%E2%80%9Critalina-%E2%80%93-usos-deabusos% E2%80%9D-
Nils Kaland, dr. polit, forskningmessig tilknyttet Høgskolen i Lil ehammer,arbeider deltid ved Lil ehammer voksenopplæringssenter Bakgrunn en påfallende sosial atferd, og Wing (1996) lanserte Autisme ble første gang beskrevet i 1940-årene (kan-begrepet autism spectrum disorders3 – autismespek-ner, 1943), men det er først i løpet av de siste årene at terforstyrrelser – for å ret
(b) (No doubt some students will have their own suggestions for simplifying the naming system. Sample answer) Thenames for esters should reflect the order in which the components are drawn. 7. presence of length of nonpolar hydrocarbon component: CH CH CH CH CH8. The products formed are likely to be a mixture of ethylamine, diethylamine, and triethylamine. These amines havedifferent numbers of